Quaresma: mesmo que o mundo diga ao contrário, somos amigos para amar

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Com o fim das festas do Carnaval, marcado pelo entardecer dos foliões e o recolhimento dos adereços festivos, inicia-se um período de introspecção e reflexão para milhões de fiéis ao redor do mundo. Para a comunidade católica, esse momento é especialmente significativo, pois representa o início da Quaresma, um tempo de preparação espiritual que culmina na celebração da Páscoa.

Neste ano, a SSVP Brasil convida o Padre Edson Friedrichsen, Coordenador Nacional da Família Vicentina, para compartilhar reflexões sobre a importância e os desafios desse período sagrado. Confira!

A espiritualidade da Quaresma nos leva a viver um retiro de quarenta dias, onde tudo nos direciona para a conversão, transformação dos corações e a vivência plena do amor de Deus.  Amor esse que ultrapassa as barreiras da geografia e do espaço (FT 1*) e nos chama à fraternidade universal. E então convertidos, podemos experimentar esse amor “desejoso de abraçar a todos” (FT 3*), cheio de compaixão, empatia e proximidade. 

O amor propagado por Jesus nos convida a ser “uma fraternidade aberta, que permite reconhecer, valorizar e amar as pessoas, independentemente da sua proximidade física” (FT 1*). É esse amor que os Vicentinos precisam entender e praticar, pois fazem parte de uma sociedade presente em todo mundo. 

Através do Batismo alcançamos a graça da “missionariedade” e assim somos chamados a “comunicar com a vida o amor de Deus, recusando impor doutrinas por meio de uma guerra dialética” (FT 4*). Estar em comunhão não se resume unicamente ao ato de receber a Eucaristia, crendo, de forma infantil, num ato mágico. Estar em comunhão é receber a Eucaristia e dizer para Jesus: eu me comprometo com a causa do Reino de Deus. Isso, sim, é viver uma espiritualidade de comunhão!

Jesus nos ensina que todos somos irmãos e irmãs, e ninguém é posse de alguém.  Somos livres no amor de Deus. Por isso precisamos viver livre de “todo desejo de domínio sobre os outros” (FT 4*). Dentro dessa cultura do encontro, precisamos levar “o amor que se estende para além das fronteiras” (FT 99*). 

O respeito à vida, que é o centro dos mandamentos de Deus, é reconhecer que o outro é templo onde Deus habita. É entender que esse respeito é o amor “para todo ser vivo” (FT 59*), que permite a todos nós um desenvolvimento integral!

“O tempo da Quaresma nos permite romper barreiras, jogar as mágoas para fora do coração, arejar a nossa existência e, assim, gerar em nós “o amor que rompe as cadeias, que nos isolam e nos separam, lançando pontes; o amor que nos permite construir uma grande família na qual todos nós podemos nos sentir em casa (…). Amor que sabe de compaixão e dignidade” (FT 62*). Nos reconstruamos neste tempo quaresmal e nos empenhamos na construção dessas pontes!

O nosso primeiro chamado foi a vida, e no amadurecer da nossa existência vamos descobrindo o que Deus espera de cada um de nós. Se estivermos atentos ao que Deus nos fala, vamos descobrir nossa “vocação para formar uma comunidade feita de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros” (FT 96*).  Descobrimos na acolhida de Deus a cada um de nós, por meio de seu filho Jesus Cristo, que somos uma grande família humana!

Estamos nos aproximando da Quaresma. Tempo de fazer escolhas. E como cristão devemos estar atentos para não fazê-las de forma polarizada. Sabendo que somos irmãos e irmãs, precisamos ter e exercitar todos os dias “a capacidade diária de alargar o círculo, chegar àqueles que espontaneamente não sintamos como parte do meu nosso mundo de interesses, embora se encontrem perto de nós” (FT 97*). Que consigamos exercitar neste tempo de Quaresma o nosso desejo de abertura, diálogo e encontro!

Jesus causou muito escândalo para aqueles que obedeceram todas as normas e leis humanas e esqueceram os mandamentos e sua essência: o Amor. Esse que nos faz poderosos.  Esse poder nos permite perceber que o amor presente nas relações sociais, o amor como base da relação entre as pessoas e os povos, é o amor à cultura. E “o amor coloca-nos em tensão para a comunhão universal”. Podemos chamá-lo assim de amor social e político.

O que adianta passar pela Quaresma apenas virando mais uma página de calendário, cumprindo um preceito, e permanecermos sem mudança que gera vida?

Num tempo de tantas guerras nacionais, internacionais, internas e familiares, aonde vamos chegar? O que queremos provar? Sou melhor que o resto do mundo? Sou mais santo? Mais justo? Sou melhor que Deus?  O amor de Deus nos chama a ser pessoas com capacidade de ter relações internacionais livres, unidade das nações, necessidade de agir e sonhar coletivamente, com visão solidária e aberta aos interesses de todos para que os poderes econômicos estejam voltados ao bem comum” (FT 13-14*). Nesse mundo de tantos conflitos somos chamados à reconciliação, respeito e tolerância! Afinal somos todos irmãos e irmãs. Nessa caminhada árida do tempo quaresmal devemos deixar fluir em nós a água viva que jorra do coração de Deus. Quaresma é tempo de nos converter ao amor, pois somos amigos para amar. 

*(FT) Carta Encíclica Fratelli Tutti

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