Quando olhamos para Vicente de Paulo e Frederico Ozanam, vemos estampado neles o verdadeiro sentido da missão. O primeiro, no século XVII, motivou a si mesmo e uma multidão de colaboradores para “fazer missão entre os Pobres”. Os resultados foram surpreendentes. Vicente de Paulo sempre falava que Jesus é o “Missionário do Pai” e, no seguimento a Jesus, o melhor testemunho que se pode dar é fazer as mesmas coisas que Ele fazia.
Para Vicente de Paulo, o melhor era cuidar dos Pobres de maneira que falar de Deus e ajudar as pessoas vulneráveis constituía para uma única e salutar ação feita ao próprio Deus. O segundo, Frederico Ozanam, partindo dos mesmos princípios norteadores de Vicente de Paulo, não só envolveu-se plenamente com os Pobres, mas também teve a capacidade de mobilizar uma multidão para “trabalhar” com e pelos Pobres. O papa João Paulo II disse: “Frederico Ozanam amava todos os necessitados. No fim da juventude, tomou consciência de que não era suficiente falar da Caridade e da missão da Igreja no mundo. Mas isso deveria traduzir-se em atitudes no serviço aos Pobres. Estava, assim, em sintonia com São Vicente de Paulo que disse: ‘Amemos a Deus, irmãos, mas com a custa de nossos braços e com o suor de nossa fronte’” (em 22 de agosto de 1997).
Ambos entenderam de modo profético que a Missão é a razão principal da existência da comunidade daqueles que creem… Para os seguidores de Jesus Cristo, tudo o que é feito na comunidade deve ser realizado em função da Missão. Foi para a missão que Jesus designou seus primeiros discípulos: “Ide a todo mundo e pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). Vicente de Paulo perguntava: “Que quer dizer missionário? Quer dizer mandado. Sim, meus irmãos, ‘missionário’ quer dizer ‘enviado por Deus’. É para nós que Nosso Senhor disse: ‘Ide pelo mundo inteiro, pregai o Evangelho a toda criatura’” (SVP – Coste, XII, 27).
Ir onde? “Ide às cadeias ver os Pobres presos. Nele encontrareis a Deus. Servi a esses pequeninos. Neles encontrareis a Deus. Ide às pobres casas e aí também achareis a Deus. Deus se alegra no serviço que prestais a esses doentes e considera feito a si mesmo” (SVP- XI, 252).
Portanto, como parte da Missão Vicentina, procura-se a evangelização dos Pobres encarnando o amor de Deus nas formas mais diversas da realidade humana. Manifestar Jesus Cristo como Senhor da História e Salvador da humanidade; como Libertador dos oprimidos, como Reconciliador entre todas as pessoas e entre elas e o Pai. O Deus missionário que aparece de Gênesis a Apocalipse em nossa Bíblia é sempre aquele que vem até nós, nos transforma pelo Seu poder libertador e, por fim, nos envia para sermos multiplicadores dessa Boa-Nova.
Não dá pra fugir dessa dinâmica. Envolver-se com o Deus da Bíblia significa estar sujeito e disposto ao envio missionário. O primeiro foi Moisés: “Vem, agora, e eu te enviarei ao Faraó para que tires o meu povo, os filhos de Israel, do Egito” (Ex 3. 10). Bíblica e teologicamente, não dá pra envolver-se com aquele que é o Grande Missionário e não ser influenciado ou impactado pelo amor à Missão. De fato, a missão de Jesus (o enviado do Pai) no mundo foi apresentar e estabelecer o Reino de Deus.
Seguir Jesus Cristo e participar da construção do Reino de Deus em nosso mundo, pelo Espírito Santo, constitui-se na tarefa evangelizante da Igreja e na tarefa vicentina no meio dos Pobres. É o exemplo deixado por Vicente de Paulo e Frederico Ozanam: tomaram a Caridade como gesto efetivo para manifestar o amor de Deus.
Frederico ficará na história da Igreja pela sua obra de caridade. E talvez hoje não tenhamos ideia das condições de miséria da Europa no século XIX. A França tinha uns 34 milhões de habitantes. Duas centenas de milhares de proprietários detinham a riqueza. Paris tinha uma multidão de indigentes. As sucessivas pestes de cólera, tifo e bubônica devastavam vidas. Nesse mundo, Frederico desempenhou sua vocação cristã de caridade. Hoje também somos chamados para a realização dessa missão, que é ajudar os Pobres a saírem da pobreza e da miséria.
Como dizia Frederico Ozanam, “Há muito boa vontade, há zelo, há famílias socorridas, há muitas a socorrer, há lugar para todas as obras de caridade possíveis sem que se prejudiquem entre si”.
Mizaél Donizetti Poggioli (Congregação da Missão – CM)