Salto, 23 de abril de 2018.
Queridas consócias e estimados confrades:
Louvado Seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
A festividade que celebramos nesta data é uma nova ocasião favorável para meditarmos na nossa vocação vicentina estabelecendo um paralelo com a vida do Beato Frederico Ozanam, que festejamos com alegria e entusiasmo, porque a sua santidade nos inspira no propósito de perseverarmos na prática da caridade, caminho certo de conquista da santificação.
Assim, um tema importante da história de Frederico Ozanam e que vale a pena refletir é a amizade, pois o fundador da Sociedade de São Vicente de Paulo sempre manteve laços de estima recíproca com muitas pessoas, tanto que foi na companhia de amigos que ele deu início nas Conferências de Caridade. Certamente, mesmo sendo jovem, Ozanam tinha plena convicção de que a amizade se caracteriza como um sentimento fiel de afeição, simpatia e ternura entre as pessoas. Aliás, a exemplo da lição bíblica, que afirma: “Ama o teu próximo e sê fiel na amizade com ele” (Eclesiástico 27, 18).
Sabemos que a nossa vivência vicentina é marcada por sólidos relacionamentos de afetividade mútua, que fortalecem e edificam o nosso engajamento na Sociedade de São Vicente de Paulo. Mas também, ao evidenciarmos a nossa unidade fraternal, estaremos comprovando o cumprimento fiel da Palavra de Deus, que anuncia: “A multidão era um só coração e uma só alma. Ninguém considerava como próprias as coisas que possuía, mas tudo entre eles era posto em comum” (Atos dos Apóstolos 4, 32).
Desse modo, temos de conduzir a nossa vida vicentina, zelando para que o nosso vínculo amigável seja cada vez mais forte, pois com essa atitude atrairemos novos aspirantes às Conferências, como resultado teremos o crescimento da SSVP e por consequência o serviço dedicado aos necessitados será melhor e eficaz. Além, de testemunharmos o mesmo pensamento de Frederico Ozanam, que escreveu: “Tenho o hábito muito querido de me identificar com meus amigos, de os tornar como uma segunda família, de me cercar deles para encher o vazio que a infelicidade me faz…” (Carta à Henrique Pessonneaux).
No entanto, como conhecemos o comportamento humano, entendemos que a convivência entre as pessoas – principalmente em grupos, tal qual são as Conferências – nem sempre “é um mar de rosas”. Por essa razão, nós precisamos preservar a vigilância para não corrermos o risco de nos tornarmos um contratestemunho denegrindo a imagem da SSVP, e desse jeito, cairmos na tentação que a Sagrada Escritura alerta através do Livro de Eclesiástico: “Pois, como um homem que mata seu amigo, assim é o que destrói a amizade do próximo” (Eclesiástico 27, 20).
Por isso, é indispensável nos movermos impulsionados pelas virtudes da humildade e da tolerância acima de tudo, vivendo em todas as nossas atividades vicentinas o espírito de união, harmonia e solicitude mútuas, para que aflorem os valores da vocação de quem está à disposição dos pequenos do Senhor, e dessa maneira reafirmarmos o ponto de vista de Frederico Ozanam, que declarou: “Deus pôs na nossa alma, duas necessidades: são necessários parentes que nos acariciem, mas são necessários também amigos que nos sejam próximos: a ternura que nos vem do sangue e a afeição que procede da simpatia são dois prazeres sem os quais não saberemos passar e um não pode substituir o outro”.
Um aspecto relevante para destacar é o fato de que está reservado por Deus aos Vicentinos o privilégio de renovarem semanalmente – nas visitas às famílias assistidas – o ato sublime que determinou o começo da Sociedade de São Vicente de Paulo, ou seja, a primeira visita aos Pobres, que foi realizada por Frederico Ozanam e seus Companheiros, ou melhor, seus Amigos. Dessa forma, é por meio desse gesto singular da vida vicentina que se concentra a oportunidade de demonstrarmos concretamente a importância da amizade no exercício da caridade, visto que as visitas aos socorridos pelas Conferências, sempre devem ser feitas nas presenças – ou em companhia – de dois ou mais Confrades e Consócias. Então, nesse momento estaremos “revivendo” o mesmo acontecimento narrado pelo primo de Ozanam, Ernesto Falconnet, que escreveu: “Nós somos uma dezena, unida estreitamente pelos laços do espírito e do coração, (…) amigos devotados que não têm segredos, que abrem a sua alma para dizer tudo sobre as suas alegrias, suas esperanças, suas tristezas” (Carta de 19 de março de 1833).
A vocação vicentina também nos confere a graça – dada por Deus – de sermos autênticos “exemplos” de amizade aos Pobres, sobretudo quando nos encontramos com os assistidos e mostramos a eles o quanto valorizamos os nossos laços de fraternidade e que nos amamos verdadeiramente. Tal sentimento, deve refletir que a amizade é um degrau seguro no intuito de alcançar e vivenciar na plenitude o amor, que nos impulsiona à prática da caridade e como consequência direta o serviço devotado a quem carece de ajuda. Portanto, nas ocasiões em que isso realmente ocorrer estará se consumando a Escritura Sagrada, que declara: “Uma doce amizade nos unia, na casa de Deus caminhávamos alegres” (Salmo 55, 15).
Igualmente necessário, é enfatizar que na Sociedade de São Vicente de Paulo – felizmente – existem muitos Casais e Famílias de Vicentinos atuando exemplarmente junto aos Pobres e por esse motivo é imprescindível citar um precioso pronunciamento do Papa Francisco, no qual proclama: “A nova evangelização deve implicar um novo protagonismo de cada um dos batizados” (Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho” (“Evangelii gaudium”), 120). Os casais e as famílias cristãs são frequentemente os mais bem colocados para anunciar Jesus Cristo às demais famílias, a fim de apoiá-las, fortificá-las e animá-las. (…) Esta alegria profunda e insubstituível que Jesus Cristo lhes dá para experimentar por sua presença em vossas casas no meio das alegrias e das tristezas, (…) tudo isso é o que tens que testemunhar, anunciar, comunicar para fora para que outros se vejam, por sua vez, colocados no caminho” (Discurso às Equipes de Nossa Senhora). Essas palavras de Francisco nos incentivam a prosseguir – incansáveis – em Casal e Família, no trabalho de socorro aos que precisam do amparo material e espiritual.
Porém, o Papa Francisco reafirmou e enalteceu num relevante documento da Igreja, a importância dos Casais e das Famílias na missão de servir ao próximo como prova incontestável de adesão radical à Palavra de Deus. Assim, a Exortação Apostólica “O Amor na Família”, revela: “Um casal que experimenta a força do amor, sabe que esse amor é chamado a curar as feridas dos abandonados, a instaurar a cultura do encontro, a lutar pela justiça. Deus confiou à família o projeto de tornar “doméstico” o mundo, para que todos cheguem a sentir cada ser humano como um irmão. Uma olhada atenta à vida cotidiana dos homens e mulheres de hoje mostra imediatamente a necessidade que há por todos os lados de uma robusta injeção de espírito familiar (…). Em troca, as famílias abertas e solidárias abrem espaço aos pobres, são capazes de ter uma amizade com as pessoas que vivem em piores situações que elas. Se realmente lhes importa o Evangelho, não podem esquecer o que disse Jesus: “Que cada vez que o fizestes com um destes, meus irmãos menores, comigo o fizestes” (Mateus 25, 40). Serás feliz! Eis aqui o segredo de uma família feliz. Com o testemunho e também com a palavra, as famílias falam de Jesus aos demais, transmitem a fé, despertam o desejo de Deus, e mostram a beleza do Evangelho e do estilo de vida que nos propõe” (Exortação Apostólica “O Amor na Família” (“Amoris Laetitia”), 183 e 184).
Por fim, e diante de tantos ensinamentos sobre o valor inigualável da amizade, temos de nos questionar:
1º. Se podemos afirmar, como fez Frederico Ozanam, que deixou escrito: “nunca fui capaz de viver sem amigos” (Carta à Prosper Dugas).
2º. Ou ainda, se os nossos amigos e amigas podem assegurar a nosso respeito: “Bem-aventurados os que te conheceram, e foram honrados com a tua amizade” (Eclesiástico 48,18).
Que Nossa Senhora, nos ilumine para sabermos compreender a valia inestimável da amizade.
Com saudades de todos! Beijo fraterno!
Confrade João Marcos Andrietta
João Marco é portador Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) e só consegue se comunicar por meio de um programa de computador