“Há pessoas que por terem um exterior bem composto e um interior cheio de grandes sentimentos de Deus, detêm-se nisto e quando veem a hora de agir, esquecem-se de tudo … contentam-se com os suaves colóquios que têm com Deus na oração, falam mesmo disso como anjos, mas ao sair daí, quando é hora de trabalhar para Deus, de sofrer, de se mortificar, de instruir os Pobres, de ir procurar a ovelha desgarrada, de gostar que lhes falte qualquer coisa, de aceitar as doenças, ou qualquer outra desgraça, aí, falta-lhes a coragem. Não nos enganemos: toda a nossa missão consiste em agir” – São Vicente de Paulo

Espiritualidade vem da palavra “Espírito” (“Spiritus”), que significa sopro, ou seja, força que leva a agir. Sendo assim, espiritualidade é aquilo que produz no ser humano uma mudança interior. É a vida segundo o Espírito, isto é, o próprio Espírito como força que nos anima e nos inspira, impulsionando-nos para a ação. É a profundidade de o próprio ser de uma pessoa, suas motivações maiores e últimas, seu ideal, sua utopia, sua paixão pela qual vive, luta e com a qual contagia.

Espiritualidade também é a relação direta com as qualidades do espírito humano, tais como amor, compaixão, paciência, tolerância, capacidade de perdoar, contentamento, noção de responsabilidade e harmonia. Espiritualidade é um estilo de vida, uma maneira de vivê-la. No caso da Espiritualidade cristã é viver o dia a dia conforme o Evangelho de Jesus Cristo. É buscar os mesmos sentimentos e posturas de Jesus.

Por isso que espiritualidade vai além de rezas, devoções, celebrações, Missas. É um estilo de vida no cotidiano: espiritualidade se vive no ônibus, na estrada, em casa, na rua, no trabalho, no sindicato, nas lutas populares, nas relações sociais, na escola, no falar, no ver, no julgar, no agir, na capacidade de comunicação entre os seres humanos.

Podemos dizer que comunicar com espiritualidade é mais do que informar, é mais do que se expressar com inteligência, é mais do que saber utilizar os “meios de comunicação”.  A comunicação permeada pela espiritualidade é a arte de gerar vínculos de comunhão. A Trindade Santa nos reflete esta “pura comunicação”, em que Deus cria pela Palavra. Logo, o Pai é o falante, o Filho é o falado e o Espírito Santo é o falando.

Sabemos que Deus falou pelos profetas e que Jesus, na condição de comunicador e a comunicação do próprio Pai, tornou-se a Palavra que se fez carne e armou entre nós a sua tenda. Hoje, a Igreja fala da voz de Cristo: “Já não sou eu que comunico; é Cristo que comunica em mim”. Aqui, entra a relação fundamental entre comunicação e espiritualidade, pois “a boca fala do que o coração está cheio”. Uma comunicação pautada na espiritualidade gera a virtude da comunicabilidade, ou seja, encontramos comunicadores de coração aberto, ouvidos abertos, mãos abertas, braços abertos, para só depois abrirem a boca!

A comunicação humana é fundamental para nós e também para o nosso relacionamento com Deus. O cristianismo é uma religião de comunicação, ou seja, auto-comunicação divina, na Encarnação do Verbo, segunda pessoa da Santíssima Trindade e também do evento Igreja como continuidade desta até os confins dos tempos. E a Igreja necessita, mais do que nunca, dos meios de comunicação para realizar o grande mandamento de Jesus sobre a missão: “Ide e evangelizai todos os povos”.

Sem dúvidas, a comunicação humana pode contribuir para uma compreensão dos conteúdos da fé, desde quando se tenha espiritualidade, pois só assim poderá falar ao coração das pessoas, sobretudo aos mais Pobres, como Ozanam mesmo nos interpela numa carta ao Padre Ozanam, em 21 de abril de 1848: “Ocupar-se sempre tanto dos empregados como dos patrões e dos operários como dos ricos, eis, doravante, o único caminho de salvação para a Igreja da França. É necessário que os vigários renunciem às suas pequeninas paróquias burguesas, rebanho de elite em meio à população Pobre que desconhecem. É preciso que se ocupem não somente com os indigentes, mas com toda essa classe Pobre que não pede esmola e que deve ser atraída por pregações apropriadas, por associações de caridade e pela afeição que se lhe demonstra e à qual muito mais é sensível do que se imagina”.

Comunicar com espiritualidade e saber expressar com palavras e gestos o quanto Deus é Amor e compreender o que disse o apóstolo Pedro em At 10,34b: “De fato, estou compreendendo que Deus não faz distinção entre as pessoas!”.

Padre Alexandre Nahass Franco (Congregação da Missão)

Assessor Espiritual do CNB

 

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