Do dia 1º a 8 de outubro, a Igreja no Brasil celebra a Semana da Vida. A data foi instituída pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). A fonte de reflexão é o tema ‘Bendito é o fruto do teu ventre’ (Lc 1,42), inspirado nos festejos pelos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida nas águas do rio Paraíba do Sul e do Ano Nacional Mariano.
Neste período, os cristãos devem discutir com muita veemência sobre todas as questões que comprometam a vida humana. Uma delas é o aborto. No ano passado, a equipe de reportagem do Conselho Nacional do Brasil (CNB) entrevistou duas pessoas que têm importantes argumentos para convencerem as mulheres a não praticá-lo. A primeira delas é a jornalista Ana Carolina Cáceres, portadora de microcefalia. Há uma discussão de que bebês diagnosticados com a síndrome possam ser abortados. Ela defende que não. O outro entrevistado é o padre Mário Marcelo Coelho, da ordem dos religiosos do Sagrado Coração de Jesus. Ele é doutor em Teologia Moral pela Academia Alfonsiana, em Roma (Itália). Confira as opiniões a seguir:
Jornalista portadora de microcefalia recrimina o aborto
No final de 2015, a jovem Ana Carolina Cáceres – de 25 anos – formou-se em Jornalismo. Toda família comemorou. Os méritos são todos dela, mas Ana Carolina só conseguiu o diploma porque teve a chance de viver. Diagnosticada com microcefalia quando nasceu, a mãe dela nem cogitou a possibilidade do aborto. Ela desafia a síndrome e tem uma vida normal. Possui um blog, onde fala sobre a patologia e já escreveu um livro intitulado “Selfie, em meu aujtorretrato, a microcefalia é diferença e motivação”.
Ana Carolina abomina o aborto. “Esta hipótese é totalmente inviável. O aborto acompanhado/legalizado sairá mais caro do que investir no tratamento destas crianças (diagnosticadas com microcefalia). E se o problema tem sido o Sistema Público de Saúde, legalizar o aborto não vai melhorá-lo. Muito pelo contrário: o aborto só irá extinguir a chance de se melhorar e investir no tratamento dessas crianças e de tantas outras pessoas”. Continua. “Fora que nossa Constituição Federal, em seu artigo 5º, defende o direito à vida e à dignidade humana. Sendo uma criança microcefálica capaz de sobreviver e até mesmo superar seus obstáculos, a hipótese de aborto é absurda e a assinatura de incompetência do poder público”.
A microcefalia causa limitações na vida de Ana Carolina, mas não a impede de fazer atividades comuns de uma jovem na idade dela. Vai a festas, tem amigos, estudou e trabalha. Na infância, precisou se submeter a nove cirurgias e sofria convulsões, que eram controladas por medicação. Atualmente, nem precisa mais de remédios. O cuidado que ela precisa ter é só evitar quedas, porque não tem a proteção óssea em torno do cérebro.
Para as mães de bebês com microcefalia, aconselha. “Elas devem procurar informação. Não somente com médicos, como também com outras famílias que passaram por este problema. Esses pais, por experiência, conhecem melhor que ninguém a microcefalia e seus efeitos. Porque a microcefalia não é uma ciência exata; ela se apresenta de várias formas”.
Ana Carolina mora em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. O blog dela é: https://xcarolinacaceres.wordpress.com/
Doutor em Teologia Moral também combate o aborto de bebês com microcefalia
A microcefalia pode comprometer o desenvolvimento da criança e, em alguns casos, levá-la a óbito. Desde que o assunto ganhou projeção nacional, um grupo de pessoas quer que o Supremo Tribunal aprove um projeto que permite o aborto de bebês diagnosticados com microcefalia. A ação fere os intensos pedidos que veem sendo feitos pelo Papa Francisco, defendendo a vida. No Brasil, o padre Mário Marcelo Coelho – da ordem dos religiosos do Sagrado Coração de Jesus – combate esta iniciativa, em entrevistas e artigos que divulga na internet. Ele é doutor em Teologia Moral pela Academia Alfonsiana, em Roma (Itália), e comenta com propriedade sobre o assunto:
A SSVP trabalha com famílias pobres. Elas carecem de tudo, principalmente de informações. Um bebê com microcefalia requer cuidados especiais e, possivelmente, gastos que estão fora das condições das famílias assistidas. Quais argumentos os vicentinos devem usar para incentivá-las a seguirem com a gravidez?
Padre Mário Marcelo – O drama pessoal porque passa a gestante e portadora do zika vírus não pode ser superado com a eliminação do mais “fraco”, não se pode tentar resolver o que é dramático com o trágico! No dramático, existe a possibilidade de uma positividade; no trágico, só a destruição. A vida deve ser acolhida como dom e compromisso, mesmo que seu percurso natural seja, presumivelmente, breve. Há uma enorme diferença ética, moral e espiritual entre a morte natural e a morte provocada. Aplica-se aqui o mandamento: “Não matarás” (Ex 20,13).
Há um grupo de pessoas que sempre tenta levar ao Supremo Tribunal um projeto em que pode permitir o aborto de bebês diagnosticados com microcefalia. Qual é a sua opinião sobre o assunto?
Padre Mário Marcelo – A criança com microcefalia é um ser vivente e, como tal, tem o direito de nascer, ser acolhida e amada. A dignidade da vida não depende do seu estado de saúde. Nem de sua duração. Onde quer que esteja presente o sopro da vida humana, aí está um valor incalculável, ante o qual todos nos devemos curvar. A morte direta e voluntária de um ser humano inocente é sempre gravemente imoral. Nada e ninguém pode autorizar que se dê a morte a um ser humano inocente, seja ele feto ou embrião, criança ou adulto, velho, doente incurável ou agonizante.
O discurso das pessoas que defendem o aborto baseia-se nas afirmações de que os bebês com microcefalia não têm muito tempo de vida e/ou, caso sobrevivam, ficam com lesões sérias. O que o senhor diria a estas pessoas?
Padre Mário Marcelo – A grande questão neste debate todo é que sempre buscam soluções pelo modo mais prático e sempre em prejuízo ao mais vulnerável, neste caso, a criança que ainda está no útero da mãe, e às vezes, sem mesmo constatar a microcefalia no bebê, basta constatar a presença do vírus zika. Neste caso específico da microcefalia, são várias realidades envolvidas: achar que uma criança com determinado comprometimento físico e/ou mental não tem o direito de nascer, de crescer e de viver. Quem apoia o aborto nestas condições está dizendo que existem pessoas de primeira, segunda, terceira… categoria, e se coloca no direito de decidir quem pode ou não nascer. Outra realidade é aquilo que a sociedade hoje defende e vive, ou seja, o horror para com as vidas marcadas pela deficiência, casais que quase sempre decidem abortar quando o exame pré-natal detecta qualquer deficiência. A partir desta realidade surgem alguns questionamentos: a microcefalia tira o direito da criança de nascer? Ela perde a condição de pessoa?
O Papa Francisco vem pedindo o fim da pena de morte, inclusive para presos condenados. O senhor considera o aborto uma pena de morte?
Padre Mário Marcelo – Aplica-se aqui o mandamento: “Não matarás” (Ex 20,13) e que vale para qualquer situação em que tiramos voluntariamente a vida do outro. Todos têm direito à vida. Nenhuma legislação jamais poderá tornar lícito um ato que é intrinsecamente ilícito. Portanto, diante da ética que proíbe a eliminação de um ser humano inocente, não se pode aceitar exceções. Os fetos com microcefalia não são descartáveis. O aborto de feto com microcefalia é uma pena de morte decretada contra um ser humano frágil e indefeso. Com toda certeza, a Igreja afirma que a vida humana é sagrada e possui dignidade inviolável. A vida de uma criança com microcefalia também deve ser protegida pela lei, assim como a de um embrião. Cada qual no seu estágio de desenvolvimento. Trata-se de um direito inalienável. Permitir a interrupção dessa vida é praticar o crime de aborto (artigos 124 a 128 do Código Penal). Independentemente do estado de saúde, a vida humana sempre deve ser preservada. A Igreja se mostra radical quando o assunto é defesa da vida humana, em particular a indefesa. A defesa da vida humana tem que ser garantida apesar do que possa se desenvolver depois. Quem vai definir o limite com que uma pessoa pode ou não nascer? A Igreja Católica é coerente com o pensamento de Jesus que assumiu a condição humana para trazer vida a todos e vida em abundância. A Igreja Católica sempre se posiciona na defesa da inviolabilidade da vida humana, mesmo ainda não nascida. A proteção da vida humana inocente e indefesa deveria interessar a todos, acima de concepções religiosas ou ideológicas; é questão de humanidade, não apenas de religião.
Fonte: Redação do SSVPBRASIL, com dados da revista Boletim Brasileiro